Ouvi os primeiros acordes de Adore, e me vi sozinha sentada numa sala de cinema. Vi e senti tudo que tinha direito, direto de 2008. De repente vi uma menina aparentemente frágil entrando na sala, e parecia estar perdida. Ficou parada na porta, e não esboçava sentimento nenhum. Tudo que fazia era olhar para aquela tela gigante e depois voltava a me observar. Só notei que ela não estava mais ali, quando a vi sentada ao meu lado. Continuei olhando aquele filme que era bonito e triste, mas confesso que estava um pouco incomodada com a presença daquela pessoa estranha. Ela pousou sua mão em cima da minha e se pronunciou:
- Foi lindo, não foi? – disse ela, enquanto secava uma lágrima.
Virei-me para olhá-la diretamente, e me perguntei se já tinha a visto antes.
- Desculpe, mas do que você está falando? – e soltei aquela minha risada de quando fico nervosa ou perdida em algum assunto. Ela riu de volta.
– Sua história. Foi tudo muito lindo, não foi? – e então ela me olhou nos olhos. Pude ver seu rosto encharcado, e presumi que ela tinha desistido de secar as lágrimas. Minha respiração foi ficando acelerada e alterada. Tirei minha mão que estava junto dela, e arrumei meu cabelo para disfarçar.
- Não sei do que você está falando. Pra falar a verdade, já estou de saída. – me levantei e me dirigi á porta. Eu parei. Parei quando a ouvi soluçando de tanto chorar. Fechei meus olhos e decidi voltar sem saber porquê. Voltei para o meu lugar e não sabia o que fazer. Ela estava aos prantos.
- Olha, eu não te conheço, mas você parece me conhecer. Não sei como, nem onde nos conhecemos. Mas, por favor, pare de chorar. Seja lá o motivo disso, vai passar.
- Você sabe que não passa, não seja mentirosa.
Ela tinha razão.
- Não passa, mas pode ser menos dolorido. – eu disse com certa segurança, olhando fixamente o telão.
Ela enxugou suas lágrimas e conseguiu se acalmar. Voltou a me olhar, e eu não tinha forças para ir embora.
- Você me conhece tão bem...E eu te conheço muito bem também. – ela olhava me olhava fixamente. E eu me virei para fazer o mesmo.
- Não, não te conheço. De onde você é, quem você é? Fala logo...
- Eu sei exatamente o que se passa nesse filme, sei tudo o que você sentiu e está sentindo agora. Sei as falas também, datas, e detalhes...Tudo. O que vai acontecer eu sei também. É torturante, frustrante, é dolorido demais, inexplicável, é imenso. É vazio, oco.
- Sim. – não conseguia fazer mais nenhuma pergunta, nem verbalizar nada.
- Eu sou você. Eu sou você nessa época, não vê? , - disse apontando para o telão.
Não me assustei com as palavras. De algum modo, parecia que eu a conhecia também, e eu acreditava nela. Virei-me para o telão, mas não enxergava a menina que estava ao meu lado.
- Me desculpe, não estou te vendo no filme.
- Eu posso entender isso. Tudo mudou mesmo, era muito provável que você não me reconhecesse mais.
Voltei a encarar o telão, tentando achar algum vestígio dela. Não consegui. Respirei fundo, pra conseguir falar algo.
- Você, apesar de ser eu, é muito diferente de mim. Eu não me vejo mais assim. Não me reconheço. Você possui uma parte de mim que não existe mais. Isso me fazia inteira, hoje não sou a metade que eu era. Têm planos e sonhos que, hoje, não me pertencem mais. Não têm medos, exceto um, que você sabe qual é. Era direta e segura de si, do seu futuro, do seu destino, do seu amor. Hoje eu não tenho certeza de mais nada. Nem planos eu tenho direito. E – fui interrompida quando as luzes foram acesas e o telão apagou. Procurei pela menina, e não a encontrei.
Me vi sentava na minha cama, sozinha, encarando a TV desligada. No silêncio.
A música tinha acabado.
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